A Palavra se fez homem...

... e habitou no meio de nós”, é o que lemos no prólogo do Evangelho de São João. O mês de setembro é todo ele dedicado à Bíblia. Naturalmente a Palavra de Deus deve estar presente todo dia iluminando nossa vida e história. Durante este mês, porém, a Igreja a põe em destaque, lendo-a, estudando-a e celebrando-a para ser amada, assimilada e vivida intensamente por todos nós em todos os dias de nossa vida. Temos um mês inteiro para focar o tema da Bíblia, falando sobre ela e sobretudo refletindo sobre como pô-la em prática.

Recentemente, o Santo Padre o Papa, Bento XVI, chamou-nos a atenção para um aspecto talvez um pouco esquecido. O Cristianismo, reafirma ele, não é uma religião do livro, mas de uma Pessoa, a Pessoa de Deus, o Verbo Divino que se fez carne, Jesus Cristo. O Cristianismo não é a religião do livro da Bíblia, como o Judaísmo é do livro da Torá e o Islamismo do livro do Alcorão. O livro dos cristãos é Jesus Cristo, o Filho de Deus que habitou entre nós, a Palavra encarnada de Deus. 

Como Jesus é o centro da história humana, Ele é o centro da Bíblia. Por isso Jesus é chave de leitura e compreensão da Bíblia. O Antigo Testamento preparou sua chegada, o Novo conta-nos a ventura de sua vinda, com sua pessoa, suas palavras, seus atos, seus milagres, sua obra e seu martírio, sua morte e ressurreição, e projeta Jesus Cristo vivo e ressuscitado para o futuro, iluminando e impulsionando a vida da Igreja, dos cristãos e da humanidade rumo ao Reino definitivo. Um santo bem do começo da Igreja, especialista na Bíblia, repetia como um refrão: “Ignorar a Bíblia é ignorar a Cristo. Conhecer a Bíblia é conhecer a Cristo!” (São Jerônimo).

É por isso que nós cristãos, católicos e evangélicos, amamos a Bíblia, a guardamos em lugar especial como um livro sagrado que ninguém joga em qualquer canto, mas todos o veneram, sem no entanto adorá-lo, porque o livro chamado Bíblia pode também virar ídolo, como qualquer símbolo quando posto em lugar de Deus mesmo.

A Bíblia é ao mesmo tempo um livro fácil e difícil de ler. Fácil porque é o mais divulgado e traduzido no mundo, podendo ser encontrado em todo lugar. Difícil porque ele foi escrito por diversas mãos e em diferentes épocas. É um livro complexo que também precisa ser estudado com a ajuda das ciências e de especialistas. Mas não é um livro de ciências; homens de fé e vida, inspirados por Deus, não cientistas, portanto, escreveram-no segundo a cultura e língua de seu tempo para contar uma História da Salvação, do amor de Deus pelos homens. 

Devemos ler a Bíblia com a cabeça, o coração e a alma, invocando o fogo do Espírito Santo para lê-la sob a luz da sabedoria divina e o calor do afeto e amor ardente, pois ela contém a Palavra Sagrada, que é espírito e vida. O mesmo Espírito que ilumina cada pessoa ilumina também a Igreja para ser “Mater et Magistra”, mãe dos que tem a mesma fé e mestra que guarda a Sagrada Escritura na sua pureza, a interpreta e atualiza com toda a diligência, a divulga e ensina com amor e a paixão dos catequistas e missionários. 

Eis porque a Bíblia deve também ser sempre acolhida segundo a tradição de fé da Igreja a que se pertence. São Paulo disse que “A letra mata, mas o Espírito vivifica” (2Cor 3,6). Isto quer dizer que é necessário discernimento e inspiração para se ultrapassar a língua, a cultura e o tempo em que ela foi escrita e entrar em comunhão com a verdade inspirada, a Palavra de Deus genuína, sem glosa, comentários, interpretações e, muito menos, manipulações. As Bíblias e suas leituras mal-feitas ou manipuladas, por exemplo, por ignorância, ao pé da letra, com fundamentalismo e ideologias, falseiam a Palavra de Deus, deturpando o sentido verdadeiro de sua mensagem, transformando-se inclusive em idolatria.

Como a Bíblia é também um livro de oração, a Igreja desde tempos remotos convida os seus fiéis à prática da “Leitura Orante da Bíblia”, em latim, a “Lecio Divina”, mediante a qual, pelos passos da leitura, meditação, oração e contemplação, todos possam alcançar a mais plena comunhão de vida com Deus.

Que o Divino Espírito Santo faça crescer cada vez mais em nós a fome e sede da Palavra de Deus, e nos torne sempre mais seus dedicados anunciadores e testemunhas!

Dom Caetano Ferrari
Bispo Diocesano de Bauru - SP

Fonte: CNBB

Nenhum comentário:

Postar um comentário